sábado, 13 de julho de 2013

Os produtores de chuva: como seres humanos controlam o clima


Ionizar a atmosfera e diminuir a emissão de pequenas partículas poluidoras pode aumentar a quantidade de chuva na região.



The Truth Denied
The Truth Denied
Nós, humanos, tentamos controlar o clima desde o dia em que trocamos nossas lanças por pás. Culturas de todos os cantos do mundo adoraram entidades que concedem chuvas, e nossos vilões da ficção científica são obcecados por inundações e secas. Mas na era moderna, não precisamos mais recorrer aos velhos deuses da chuva. Nós temos a tecnologia, finalmente, para criar nuvens carregadas à nossa vontade.
Isso não significa que a transição do rezar pela chuva para a fabricação de chuva foi fácil, ou mesmo que os métodos atuais são os mais eficientes possíveis. A história da modificação do clima, o ato de intencionalmente manipular a atmosfera, tem sua parcela de charlatães e enganadores. Você talvez tenha adivinhado que, levando isso tudo em consideração, esse assunto tenha crescido a partir da pura superstição.
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Estourar nuvens já foi um estouro
O manipulador do clima charlatão mais famoso foi o psicoanalista austríaco Wilhelm Reich. Ele desempenhou dezenas de experimentos nada científicos ao longo dos anos 1950 e 1960 que culminaram em resultados altamente questionáveis, longe de serem bem vistos pela comunidade científica.
As técnicas de manipulação do clima de Reich estavam entre as mais absurdas tentativas de inovação. Ele usava uma série de tubos ocos, como uma flauta gigante de metal, grudados a mangueiras de metal flexíveis na parte de trás que, por sua vez, eram anexadas a tubos ocos de metal menores que tinham uma das suas extremidades mergulhada em uma compartimento com água. Essa engenhoca supostamente aproveitava a “energia orgânica” da água e a atraía da atmosfera, convertendo-a em umidade. Meio como um para-raios, mas no fim das contas, pura balela.
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Semeadura de nuvens: os bebês de proveta da atmosfera
Semeadura de nuvens é o contrário do estouro de nuvens. Para começo de conversa, é uma coisa real. O processo foi replicado inúmeras vezes tanto em laboratório, quanto no campo e é embasado por anos de pesquisas científicas. Na prática, ele consiste em impregnar as nuvens para instigar o processo de precipitação em vez de magicamente criá-las, do nada, usando energias obscuras.
A semeadura de nuvens atualmente é usada em todo o mundo — incluindo Estados Unidos, China (onde é usada para limpar a poluição em Pequim), Índia e Rússia — para otimizar a precipitação, tanto de chuva quanto de neve, e ao mesmo tempo inibir o granizo e a neblina. E ela funciona.
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A semeadura de nuvens tem efeito ao espalhar partículas microscópicas, como o óxido de alumínio ou o iodeto de prata, a fim de afetar o desenvolvimento da condensação, agindo como núcleos de gelo artificiais. Elas dão efetivamente aos cristais de gelo algo para crescerem sobre. A parte ruim da semeadura de nuvens é que ela exige que o ar ao redor já tenha certa porcentagem de vapor d’água; não dá para criar algo do nada.

O método que usa especificamente iodeto de prata foi descoberto por Dr. Bernard Vonnegut, irmão do escritor Kurt Vonnegut, em 1971. Como os iodetos de prata têm uma estrutura cristalina similar à do gelo, eles formam um recife artificial onde os cristais podem crescer.
Entretanto, Vincent Schaefer é creditado como descobridor dos princípios da semeadura de nuvens contemporânea. Em 1946, após uma caminhada pelo Monte Washington, em New Hampshire, com o ganhador do prêmio Nobel Irving Langmuir, Schaefer desenvolveu um sistema de nuvens super refrigerado (no qual o vapor d’água líquido fica a quase 0º Celsius) a partir de um congelador em seu laboratório para estudar os efeitos do crescimento de cristais de gelo em uma variedade de meios, do pó de talco ao sal de cozinha, passando pelo solo superior. A nuvem, para esse experimento, consistia em um grande bafo de ar exalado dentro do congelador. Em um dia quente de verão, o congelador simplesmente não conseguia trabalhar a ponto de manter a câmara fria o bastante, então Schaefer deu uma ajudinha ao processo jogando um pouco de gelo seco lá e, nesse momento, descobriu uma forma de transformar instantaneamente vapor d’água super gelado em gelo. Novos experimentos replicaram com sucesso o efeito, com -40º Celsius sendo definido como o limite transformador para a água líquida super gelada.
Diferentemente do iodeto de prata, que dá um ponto de partida aos cristais, o método do gelo seco simplesmente baixa a temperatura o bastante para incitar a cristalização espontânea enquanto produz um vapor super saturado. Eles são normalmente entregues por aviões, que liberam feixes de iodeto de prata quando voam por entre as nuvens, ou por sistemas em solo como os Howitzers ou baterias anti-aéreas.
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Embora o gelo seco e o iodeto de prata sejam os dois principais métodos de semear nuvens, o propano líquido e o sal de cozinha também são usados. O sal se mostrou especialmente eficaz em nuvens mais aquecidas, como as do México e África do Sul, porque os cristais de sal geram gotículas maiores do que se esperaria e se precipitam das nuvens mais prontas.
Os esforços norte-americanos para a semeadura de nuvens são bem documentados. Na sufocante umidade do verão de Alexandria, Virgina, em 1948, o prefeito Carl B. Close ordenou a semeadura de nuvens com gelo seco e foi quase que imediatamente recompensado com 21,6 mm de chuva – durante uma seca. E embora tratados internacionais atualmente proíbam a modificação do clima para fins de guerra, de março de 1967 a julho de 1972 os militares do 54º Esquadrão de Reconhecimento Climático dos EUA levaram a cabo a Operação Popeye, um grande trabalho de semeadura de nuvens visando estender o período de monções sobre o Vietnã na esperança de afundar a trilha Ho Chi Mihn por mais 30~45 dias por ano. O lema do esquadrão: “faça lama, não guerra”.
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Os ionizadores dos Emirados Árabes Unidos
Os Emirados Árabes Unidos são uma terra cheia de riquezas, mas pobre em precipitações. É por isso que o presidente xeique Khalifa bin Zayed Al Nahyan alocou, secretamente e por anos, as mentes científicas mais brilhantes do país para criar novos meios de manipular o clima que funcionassem de modo mais efetivo em regiões de temperaturas extremas. Resultado? A maior brisa iônica do planeta.
Dispositivos de brisa iônica são ionizadores gigantes montados no topo de grandes mastros de aço construídos por uma empresa suíça, a Metro Systems International. Os dispositivos geram campos iônicos massivos, jogando íons carregados positivamente de volta para o chão enquanto os negativos são elevados à atmosfera. Enquanto sobem, os íons negativos (elétrons) coletam partículas de poeira pelo caminho. Elas funcionam como sementes para a formação de cristais de gelo da mesma forma que o iodeto de prata faz, mas sem a necessidade de nuvens. Desde que a umidade do ar seja de pelo menos 30%, o sistema teoricamente funciona mesmo com o céu limpo, sem nuvens.
No verão de 2010, 100 emissores do tipo foram espalhados em mais de cinco áreas na região de Al Ain. Durante julho e agosto, quando normalmente não chove nessa área, estima-se que tenha chovido em 52 ocasiões, com ocorrências frequentes de rajadas de vento e, algumas vezes, até granizo. O Instituto Max Planck de Meteorologia monitorou o projeto e ratificou as descobertas do estudo. Isso pode ter um impacto enorme para o Oriente Médio, onde água é um bem escasso e as plantas de dessalinização são investimentos caríssimos (para serem criadas e, depois, mantidas). Já os ionizadores, custam cerca de US$ 10,5 milhões para serem construídos e US$ 8,9 milhões por ano para operarem.
Daily Mail
Atlanta e a Lei do Ar Limpo
Mas por que gastar todo esse dinheiro quando você pode apenas inibir a poluição obtendo o mesmo efeito? É isso o que Atlanta fez.
Quando a Lei do Ar Limpo (Clean Air Act, no original) entrou em vigor em 1970, ninguém poderia prever os incríveis efeitos imediatos que ela teria no meio ambiente. Nos primeiros cinco anos após a aprovação da lei, a emissão de pequenas partículas (menores que 10 micrômetros) diminui 40% em todo o país. Nas duas décadas que se seguiram, a média de chuvas em Atlanta subiu 10% e permaneceu nessa faixa.
Ocorreu que a poluição do ar causada pela área industrial de Atlanta nos anos 1950 e 1960 resultou em nuvens menos eficientes. Isso é, o tamanho diminuto das partículas de poluição era ótimo para a formação de nuvens, mas terrível para criar precipitações. Para isso, são necessárias partículas maiores também. “Você não quer toneladas das pequenas, que era o que Atlanta tinha nos anos 1950 e 1960″, diz Jeremy Diem, climatologista da Universidade da Georgia, à Scientific American.
a454/Shutterstock
O céu é o limite
Durante as Olimpíadas de 2008, que sediou, a China organizou uma grandiosa cerimônia de abertura. O governo do país tinha 30 aviões, 4 mil lançadores de foguetes e 7 mil baterias anti-aéreas preparadas para acabar com qualquer precipitação em potencial. Isso levanta mais do que algumas questões técnicas e éticas, como “quais as consequências ambientais e patológicas em se espalhar grandes quantidades de iodeto de prata na atmosfera?” e “Se a China pode parar a chuva por mero capricho para as Olimpíadas, o que a impede (e a outros países) de transformar essa habilidade em uma arma?”
Por outro lado, existe um aspecto significativo nesses métodos de controle do clima além de simplesmente fazer chover. Muitas dessas técnicas podem ser usadas, por exemplo, para mitigar as destrutivas forças dos furacões.
No geral, embora as técnicas de manipulação do clima possam ser usadas tanto para o bem quanto para o mal, o futuro da ciência parece promissor. Com os avanços nos sistemas de modelagem e pesquisa atmosférica em larga escala, em breve nós talvez possamos ser capazes de controlar o clima com o apertar de um botão. E será aí que a real diversão começará.

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