Ao menos 244.712 pessoas poderão deixar de ser cearenses por causa de uma disputa judicial entre os estados de Ceará e Piauí. Trata-se de uma ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), desde 2011, e prevê uma reconfiguração territorial, a partir da qual seis municípios na região da Serra da Ibiapaba passariam para o lado piauiense. Outras sete cidades também teriam extensão modificada. O assunto foi discutido nesta sexta-feira (19), na Assembleia Legislativa do Ceará.
“Desde 2011, quando o Estado do Piauí entrou com essa ação no STF, a temática voltou com mais força. O que pude perceber é que ainda não existe um estudo, um levantamento oficial feito pelo IBGE, mas apenas estudos documentais. Então, nada melhor do que a Casa Parlamentar para apoiar, no sentido de resolver essa pendência, que não é fácil, porém, com vontade, vamos resolver de uma vez por todas”, pontuou o presidente da Assembleia, Evandro Leitão (PDT).
A área afetada compreende cerca de 3 mil km², 1,9% do território cearense, segundo dados do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece).
O governo do Piauí se baseia em uma disputa de litígio, um conflito de interesse, que se iniciou há dois séculos.
Em 2016, o Exército Brasileiro apresentou um relatório preliminar sobre a área, a pedido do STF, que prevê as perdas territoriais no Ceará.
O assunto volta à tona após, no fim do ano passado, o STF conceder ganho de causa similar ao estado de Tocantins. Já há, portanto, jurisprudência sobre o assunto, o que preocupa o Ceará visto que o relatório do Exército foi favorável ao Piauí.
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Pelo relatório apresentado pelo Exército ao STF, os municípios de Ibiapina, São Benedito, Guaraciaba do Norte, Carnaubal, Croatá e Poranga passariam a ser considerados territórios do Piauí.
Outras sete cidades também passariam por mudanças territoriais segundo o relatório, são elas: Granja, Viçosa do Ceará, Tianguá, Ubajara, Ipueiras, Ipaporanga e Crateús.
Uma reunião entre deputados estaduais, técnicos, membros da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e prefeitos de cidades potencialmente afetadas ocorreu nesta sexta (19) com a intenção de iniciar uma força-tarefa contra os possíveis prejuízos.
A deputada Augusta Brito (PCdoB), coordenadora do Comitê de Estudos de Limites e Dívidas Territoriais do Ceará desde 2019, ressalta que “pensar na simples possibilidade de não ser do Ceará, das cidades onde nós crescemos, é uma angústia enorme. Estamos aqui tentando unir essas forças, fazendo um além, mais do que simplesmente da questão jurídica”.
De acordo com os dados do Ipece, o Estado perderia, com base no relatório preliminar do Exército, 290 escolas; 6 centros de educação infantil, 3 escolas profissionalizantes, 172 Unidades de Saúde, 24 centros de convivência e 733 km de estradas.
Também mudariam para o lado piauiense o aeroporto do município de São Benedito, 598 torres eólicas, 117 áreas de mineração, 21.747 estabelecimentos agropecuários, uma Unidade de Conservação Estadual (Bica do Ipu), uma Unidade de Conservação Federal (Parque Nacional de Ubajara), 2 açudes (Jaburu/Ubajara e Lontras/Ipueiras) e 1.549 poços profundos.
Ações
Dentre as propostas apresentadas, estão a realização de plebiscito ou referendo em cada município, articulado pelas prefeituras e Câmaras Municipais, realização de campanha publicitária e produção de material gráfico informativo a ser distribuído nos municípios afetados, além de reunião da PGE com as procuradorias municipais.
Um dos argumentos a serem usados na defesa judicial do caso, segundo a procuradoria, é de que o relatório apresentado ao STF leva em consideração apenas questões geográficas.
“O prejuízo não é só econômico ou administrativo, impacta nossa representação federal, estadual”, lembra o deputado Acrísio Sena (PT), que participou da reunião. “O Piauí não investiu nada, o relatório do Exército é cartográfico com base em mapas do império […] imagina (o impacto para ) o cidadão que nasceu na Serra da Ibiapaba e se entende como cearense”, argumentou.
O deputado Salmito Filho (PDT) propôs ainda acionar a bancada cearense na Câmara dos Deputados, para que haja uma ação em conjunto, inclusive com parlamentares de outros estados, em defesa do território cearense.
“Temos que confiar no STF, os interesses meramente econômicos do Piauí não podem prevalecer sobre as questões históricas”, pontuou a procuradora da PGE, Ludiana Rocha.
Novo encontro
Na semana que vem o comitê se reunirá mais uma vez para debater o assunto. Uma cartilha informativa e uma campanha nas redes sociais serão produzidas pelo corpo técnico da Assembleia Legislativa. A intenção é que o assunto seja amplamente debatido.
A reunião contou também com a participação dos deputados Queiroz Filho (PDT), dos prefeitos Saul Maciel (São Benedito), Marcos Antônio da Silva Lima (Marcão – Ibiapina) e Marcelo Machado (Crateús), além representantes de das Câmaras de Dirigentes Lojistas de cidades da região, assim como da Procuradoria da AL.
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