Uma pesquisadora da
Universidade de Harvard (EUA) divulgou em um congresso na Itália nesta
semana a descoberta de um fragmento de um papiro copta - possivelmente
feito em algum momento entre os séculos 2 e 4 - e que reaqueceu uma
antiga discussão: o texto cita uma suposta mulher de Jesus. Segundo o
professor André Chevitarese - do Instituto de História da UFRJ e da
Unicamp -, não há evidência sobre a vida conjugal de Jesus, nem mesmo a
Bíblia faz qualquer menção. A discussão sobre o tema, afirma o
historiador, veio a aparecer somente no século 2 e reflete, nos dias de
hoje, tabus erguidos pela Igreja. "Nesse texto que Karen King trouxe não
tem história, tem teologia, não tem história."
"A
Bíblia cristã não deixa transparecer absolutamente nada sobre Jesus ser
celibatário ou não, mas, com certeza, nós podemos falar que no
movimento mais originário, com Jesus ainda vivo, no seu entorno
gravitaram homens e mulheres que tiveram a primazia, a possibilidade, em
termos igualitários, de dormir com Jesus, acordar com Jesus, tomar um
café da manhã, almoçar e jantar com Jesus. Portando, Jesus, no seu tempo
histórico, constituiu uma comunidade não apenas de homens, mas de
homens e mulheres. Então, o argumento teológico de que Jesus só fez 12
apóstolos é bullshit, isso é falso. Jesus constituiu em torno de si
homens e mulheres em uma não hierarquia, uma não hierarquização."
Chevitarese,
autor de diversos livros sobre Jesus do ponto de vista da história e
sobre os cristãos na Antiguidade, explica que as comunidades da época em
que se discutia a relação conjugal desse personagem - séculos 2 e 3 -
já não tinham mais contato com a história dele, mas a usavam para
defender determinados ideais ou pontos de vista.
"Jesus
já ficou para trás há pelo menos 250 ou 300 anos. Então essas
comunidades, muito embora se refiram ao que Jesus disse, o que Jesus
(segundo elas) disse diz muito mais sobre as dúvidas, as questões que
cada uma dessas comunidades cristãs experimenta no seu próprio tempo, do
que propriamente uma situação do Jesus histórico lá do século 1",
afirma. "Se estabelece ou se usa a figura central ou a referência
central do cristianismo para externar preocupações que uma liderança ou
uma parte da liderança ou a própria comunidade quer dizer sobre certo
objeto. Não temos que conectar isso com Jesus, mas com experiências de
comunidade."
Nesse
momento histórico, comunidades de cristãos discutiam se o mais adequado
era a vida celibatária ou o casamento. "As comunidades estão discutindo
'devo ser um eunuco?', como diz Mateus, 'viver como um eunuco?'. Na
tradição de um cristianismo católico, um eunuco se refere a ser
celibatário. Portanto, Jesus é celibatário (...) ou devo trabalhar com o
modelo de um Jesus que constitui uma família?"
O
historiador compara esse período com, por exemplo, um religioso que
esteja em uma cruzada contra o casamento de pessoas do mesmo sexo. Ele
pode fazer, afirma o professor, uma leitura própria dos textos da Bíblia
para apoiar o seu ponto de vista, digamos, condenando o casamento
homossexual, mas permitindo a separação e novo casamento de
heterossexuais. "Essas atualizações teológicas são muito mais o 'meu
espelho' do que história."
Chevitarese
diz ainda que temos encarar as comunidades religiosas como sendo
plurais, com cada uma com suas ideias e problemas, mas todas buscando um
mesmo modelo a seguir. "Toda e qualquer experiência religiosa (...) é
sempre uma experiência humana que busca viabilizar um contato com esse
'mundo cósmico', por isso são sempre plurais e multifacetadas, ou seja,
há cristianismos, há judaísmos, há islamismos. (...) Eu não acho que o
modelo que aparece aí de um Jesus se referindo a alguém, que a gente não
sabe (quem é), mas como 'minha mulher', que isso seja uma discussão que
estava em todas as comunidades cristãs, isso é uma questão específica
de uma comunidade que introduziu o texto. Eu vejo experiências cristãs,
eu não vejo cristianismo. Essa é uma leitura teórica minha."
Karen
King, pesquisadora que apresentou o fragmento, acredita que o papiro
foi criado entre os séculos 2 e 4 - ainda não foi analisada quimicamente
a data do objeto - e que pertença a um texto maior, escrito em grego e
que seria um evangelho desconhecido.
Mudanças hoje
O
historiador afirma que esse pequeno papiro milenar está diretamente
ligado a uma discussão bem atual - a do papel da mulher na Igreja. "A
igreja católica hoje (se fosse comprovado que Jesus não foi celibatário)
continuaria achando legitimação e base para sustentar a tese de que
seus sacerdotes e suas irmãs consagradas, as freiras, devem ser
celibatários? E as teólogas feministas que reivindicam para si um espaço
maior de atuação no campo das igrejas que elas atuam, podem ser
consagradas como sacerdotisas e estarem no púlpito pregando? Esse é um
ponto nevrálgico da questão. É isso que movimenta a discussão de um
documento como esse que Karen King, uma pesquisadora seríssima, traz à
tona."
"No
fundo, essas discussões eu acho que pouco têm a ver com Jesus, mas
Jesus é central porque ele fala a cerca de 3 bilhões de indivíduos hoje.
Mas se Jesus era casado ou não, nada tem a ver com século 1, século 2
ou século 3, porque já passou, mas tem a ver com o século 21. Se Jesus
era casado, eu tenho que repensar as estruturas que as igrejas católica,
ortodoxa grega, as protestantes históricas me oferecem."
Maria Madalena
"Se
nós tivéssemos que projetar uma suspeita sobre que Maria é essa, eu
apostaria 100% das minhas fichas em Maria Madalena. Maria Madalena é uma
pedra no sapato, é um incômodo para a ortodoxia. Por que é um incômodo
para a ortodoxia? Por que ela seria a verdadeira mulher de Jesus? Não,
porque Maria Madalena, no Evangelho de João (penúltimo capítulo), é a
única testemunha ocular a informar que Jesus não está morto, está vivo,
que seu corpo não foi roubado, mas que seu corpo foi ressuscitado e que,
de fato, nele se cumpre todas as promessas que foram feitas pelos
profetas, por Deus, etc. Então, ela, desde o início, goza de uma
primazia que gera um incômodo no século 2, no século 3 no processo de
negociação entre em uma ortodoxia e o Império Romano. E essa ortodoxia
impondo uma leitura falocrática".
O
pesquisador afirma que esse debate se encerra somente no século 6,
quando é adotada a figura de Maria Madalena como uma prostituta
arrependida. "Antes disso, ela tem esse espectro extremamente vasto, que
vai desde uma apóstola, passando por mulher, até uma prostituta. Mas, é
com o papa Gregório é que ela vai ganhar esse contorno dentro da
ortodoxia de que ele é obrigado a reconhecer que ela tem uma
proeminência, mas (afirma que) um dia foi prostituta. É uma leitura
maldosa, que nada tem a ver com Maria Madalena", diz o historiador.
Conforme
Chevitarese, a Igreja foi desfazer essa imagem apenas no século 19
(quando passou a ser considerada santa), mas a ideia já estava
cristalizada. Até o cinema ajudou a difundir a visão de que Maria
Madalena era prostituta - o professor cita o filme O Rei dos Reis, de
1927, de Cecil B. DeMille.
Fonte: Terra
O POVO TEM MEDO DE DIZER A VERDADE
ResponderExcluirSER ESTUDDO NÃO VALE NADA SE NÃO TIVER PRÁTICA.
JESUS FOI CASADO SIM COM MARIA MADALENA E TEVE UM FILHO CHAMADO ISAACJOSE CORADO HOFMANN