A musa Camilla de Castro cometeu suicídio em 2005 |
Embora sejam abordadas por homens de todas as idades, classes sociais,
belezas e níveis culturais, as travestis e transexuais enfrentam
inúmeras pelejas em seus relacionamentos amorosos. Enquanto a massa
masculina se sente fascinada (veladamente, diga-se) por suas figuras,
pouquíssimos homens aceitam assumir de fato um romance. Preferem o
anonimato, as traições, o tradicional momento escondidinho...
Muitos t-lovers [homens amantes de trans] temem sobretudo serem
encarados como homossexuais ou sofrerem preconceito – fruto do machismo e
homofobia- por tabela. Para os que se envolvem, há os que se tornam
cafetões, há os que vivem à custa da parceira e há quem não as dê nada
em troca (nem dinheiro, nem respeito), como ir para cama fosse um favor
para satisfazerem-lhes o “vício”.
Antes de cometer suicídio em 2005, a musa Camilla de Castro (foto) – que
fez sucesso no Superpop com o quadro Camila quer Casar - escreveu um
depoimento, em que dizia sofrer por ser desejada entre quatro paredes,
mas nunca em público. “Disseram que não existe amor para travestis e que
os homens nos viam como privadas humanas, onde descarregavam seus
desejos mais “loucos” sem sequer olhar para trás”.
Camila morreu sem vivenciar o amor.
Dentre várias razões, esta triste realidade – que está se transformando e
tendo casos exemplares nos últimos anos – deve-se pela falta de
esclarecimento e por conta de nossa gramática sexual, pobre, binária e
sexista. Afinal, travestis e transexuais transcendem a lógica arcaica de
“sexo biológico-gênero-sexualidade”, o que é ser homem, ser mulher, gay
e hétero, logo são uma incógnita. Para os seus parceiros, as dúvidas se
multiplicam e o que prevalece é o machismo.
A questão que mais faz parte das dúvidas dos nossos leitores é: “Homens que ficam com travestis são gays?”. E aí, meninas?
Fernanda Vermant |
“Eu me atraio e me sinto feliz com homens héteros, porém namoro um
modelo que gosta de travesti. É o que tem para mim nesse Brasil e não
vou dispensar... Penso que homens que gostam de travestis são gays,
porque gostam na verdade do pênis delas. Mas, por outro lado, acredito
que sejam héteros os homens que aceitam a sua amada e a observam como
uma verdadeira mulher, sendo operada ou não. Há ainda um estudo que visa
pesquisar o comportamento sexual e que encara os homens que gostam de
trans como uma nova orientação sexual.
É difícil definir o relacionamento das trans, porque muitas nós não nos
aceitamos – o corpo, a identidade, a referência trans - logo ninguém nos
aceitará.... Nos dias atuais, homens héteros ou gays enrustidos só saem
com travestis para fantasias ou alívio para o seu homossexualismo [sic]
reprimido. Os amigos do meu namorado, por exemplo, inclusive os gays,
não apoiam o nosso relacionamento. Mas, acima de qualquer reprovação e
medos, o mais importante é ser feliz, né gente? Love, Fernanda”
Patricia Araújo |
“Homens que se relacionam com travestis não são gays, são héteros. Digo
isso porque a imagem que temos é feminina e o gay não se interessa por
uma imagem feminina. O gay gosta é de outro homem, com corpo, trejeitos e
maneira de ser masculina – o que obviamente não é o meu caso. Muitos
homens se sentem atraídos por nós por conta da nossa feminilidade e
mistério, querem saber como é, como funciona... Já fui casada com homens
héteros, lindos, que respeitaram a minha identidade. Outros não foram
tão legais, mas esses a gente deleta. Para aqueles que preferem ser
passivos, não há nenhum problema, pois isso não faz dele gay. É sabido e
comprovado que a próstata é um lugar que, se massageado, penetrado,
proporciona um grande prazer.
É por isso que muitos homens, casados com mulheres, saem com travestis:
para ter mais esta forma de prazer em sua vida sexual. Hoje, consciente
dessa realidade, muitas mulheres fazem inversão de papeis e penetram
seus maridos. Nós - travesti, transexuais e mulheres - devemos parar de
nos assustar com a questão da passividade, afinal a grande maioria dos
homens adoram explorar todos os prazeres do corpo, sem neuras ou tabus,
Que vivemos felizes, sem rótulos, sem culpas!"
Kimberly Luciana |
"Tive apenas dois grandes amores na minha vida. No primeiro, tinha 17
anos, namorei durante um ano e fui casada durante nove. Ele nunca foi
passivo comigo, mas não apoiava a possibilidade de um dia eu mudar de
sexo. Fui feliz ao seu lado por cinco anos, os outros continuei porque
fiz o que qualquer casal hétero faz: levei em conta que era dependente
financeiramente, que ele não me agredia e que era trabalhador.
No meu ponto de vista, ele é heterossexual, pois sempre me viu como uma
grande mulher e, tempos depois, se casou com uma mulher biológica. Não
acho que ter ou não um pênis seja fundamental para um envolvimento
amoroso,
O segundo relacionamento me deixou cicatrizes na alma. Nos conhecemos
pelo Orkut e, após nos vermos pessoalmente, me apresentou para a família
e amigos. O problema é que, com o tempo, descobri que ele era uma
pessoa doente por sexo. Ele me proibia de ter uma vida social e queria
vivesse absolutamente para ele. Abri mão do relacionamento. Não poderia
viver apenas de sexo e amor.
Sou assumidamente travesti e, se existir de fato amor para uma trans,
acredito que ele quebre qualquer barreira. O problema é que, da minha
experiência e observação, posso concluir que a maioria dos homens que
nos amam de fato são problemáticos, emocionalmente inseguros, tímidos,
compulsivos sexuais, com baixa-estima, bandidos, policias e pobres. Se
ele quiser um namoro às escondidas, não aceito, mesmo que ele seja um
boy magia (risos). Isso é preconceito internalizado."
Luiza Gaúcha |
“O homem pensa que, para não ser julgado ou discriminado, deve fazer o
perfil de machão, jogador de futebol, o pegador de gatinhas. Mas os
desejos sexuais e afetividades não deveriam ser julgados ou criticados
por ninguém. Afinal, a observação sobre ela vai se modificando com o
tempo. Na antiguidade, por exemplo, o ato de um homem deitar com outro
era status de poder, pois para eles a mulher era um ser frio. Hoje, ele
ganha apelido de viadinho, mariquinha, caso o faça. Além disso, nós
trans representamos uma nova realidade.
Nossos desejos sexuais, afetivos e nossas identidades estão em
constantes transformações. Assim como a transexual não decide “virar
mulher” da noite para o dia, o desejo de um homem por um homem, o desejo
de uma mulher por uma mulher e o desejo de um homem por uma travesti ou
transexual também não acontecem da noite para o dia. Estamos sempre em
busca de oportunidades, descobertas. E o sexo é apenas mais uma fantasia
do nosso teatro, não deveria ser omitido.
Penso que o pênis seja apenas um detalhe que a transexual não operada
tem a mais que uma mulher e tudo vai depender do desejo do seu parceiro.
Para uns não faz diferença, para outros é o que te destaca em relações a
outras. É muito relativo e se chama desejo. Não os classificam como
gays ou héteros.
Vivo um caso amoroso a cada dia, mas não sou do tipo superficial. Gosto
de me entregar de corpo e alma quando estou com alguém, nossos momentos
são únicos e bem aproveitados. Acabo escutando um pouco de tudo dos
homens. Muitos eu acredito que agrado, outros sou vista como um mero
objeto. De certa forma, todos nós acabamos sendo objeto ou um fantoche,
já que estamos sempre sendo manipuladas e também manipulando. Mas ainda
sou sonhadora e não deixaria de viver um grande amor por nada".
Alê Oliveira |
“Antes de mais nada, adianto que não me interesso por homens. Mas penso
que homens que ficam com travestis ou transexuais não são gays. O motivo
é simples: elas se identificam com o feminino – veja que estou falando
em GÊNERO, que nada tem relação com SEXO BIOLÓGICO. E um homem gay
geralmente está a procura da imagem masculina (o gênero masculino),
coisa que uma travesti não tem.
No relato de muitas amigas, elas dizem que muitos ficantes nem tocam no
pênis, mas também há casos em que eles querem utilizar o seu “atributo a
mais”, o que mostra que varia de pessoa para pessoa e que não dá para
rotular esse ou aquele de gay só porque ele é ativo ou passivo.
Quando eu era um menino, já namorei uma travesti e isso não me fazia
sentir gay. Sempre gostei de me relacionar com mulheres, figuras
femininas. Portanto, para mim, falar que um homem que se relaciona com
uma travesti é gay é o mesmo que anular a identidade de gênero da
travesti, é chama-la de homem. E muitas travestis conseguem ser muito
mais femininas que mulheres biológicas, mesmo com esse algo a mais. O
pênis é só um detalhe na vida prática.
No meu casamento, minha mulher costuma dizer que não me vê como homem ou
mulher, embora me trate no feminino. Ela simplesmente vê a pessoa que
ama. É por isso que penso que no fundo, a definição não é o mais
importante”.
Lirous |
“Sou bissexual e isso é desde sempre, pois o que me move a gostar de uma
pessoa é o que está por dentro dela e não a sua aparência física e
sexo, que para mim sempre foi consequência. Sempre tive relações
duradouras e que sou comprometida desde sempre. Hoje, sou casada pela
segunda vez no cartório, tenho o consentimento de ambas as famílias
Nunca tive relacionamento as escondidas, pois não aceito esse tipo de
situação. Se a pessoa não se sente segura, que vá buscar segurança em
outro lugar. O que muito me preocupa é no discurso de muitos homens
machistas que afirmam que não teriam interesse em namorar uma trans pelo
fato de ela não gerar filho. Mas eu pergunto: “E se a mulher fosse
estéril?”.
Mas também existem muitos homens esclarecidos e os mais novos, de 18 e 19 anos, que já são mais decididos e mais corajosos.
O órgão sexual é um tabu muito desejado, pois o homem que procura uma
trans tem o interesse principal em torno dele. O fato de ser ou não
passivo não vai mudar a condição dele, que naquele momento é de
homossexual. E o fato de um homem ter uma relação homossexual não faz
dele um gay, pois as identidades de gênero não correspondem nunca com o
sexo, pois existem gays que se relacionam com pessoas do sexo oposto.
Ser gay vai além de se relacionar sexualmente com pessoa do mesmo sexo.
Sou contra o termo de ser heterossexual, pois é uma condição e você pode
simplesmente “estar hétero” ou “estar homo”. O estar é o momento em que
você está vivendo ou se relacionando com outra pessoa, seja ela do
mesmo sexo ou não. Na área da saúde trabalhamos muito com um público
denominado HsH, que são homens que fazem sexo com outros homens, mas não
são considerados gays.
Mas, para que não me aprofundas muito nesse estudo, sugiro que assista ao vídeo chamado “homossexualidade e ponto final”.
Neto Lucon
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